domingo, 30 de março de 2014

50 anos do golpe – Os esqueletos no armário da imprensa grande

A apoteose do revisionismo histórico: sobre o editorial da Folha há meio século do golpe de 1964


Por Demian Melo
Hoje (30 de março de 2014) o jornal Folha de S. Paulo publicou editorial em que busca explicar seu apoio ao golpe de 1964 e à ditadura que se seguiu (disponível aqui). Como já é conhecido pelos pesquisadores, o apoio do Grupo Folha foi mais além de um noticiário favorável à ditadura, tendo chegado a se empenhar na ativa colaboração com a Operação Bandeirantes, cedendo suas caminhonetes para a captura de dissidentes políticos que seriam submetidos à tortura e ao assassinato (sobre isso ver o documentário Cidadão Boilesen,aqui).
Num tom muito mais cínico do que o famoso editorial de O Globo do ano passado, a Folha não se conteve em ensaiar uma suposta autocrítica, e buscou reafirmar as “realizações” da ditadura no campo econômico.

Com seus esqueletos guardados no armário, o passado colaboracionista da grande imprensa agora vem à tona na efeméride do cinquentenário do golpe de 1964. Do mesmo jeito que em O Globo, que em vez de autocrítica enunciou os motivos por ter apoiado o arbítrio, a Folha agora vem concluir seu revisionismo histórico tecendo elogios descarados ao regime ditatorial. Em um dos trechos mais inacreditáveis é possível ler:
“Em 20 anos, a economia cresceu três vezes e meia. O produto nacional per capita mais que dobrou. A infraestrutura de transportes e comunicações se ampliou e se modernizou. A inflação, na maior parte do tempo, manteve-se baixa.Todas as camadas sociais progrediram, embora de forma desigual, o que acentuou a iniquidade. Mesmo assim, um dado social revelador como a taxa de mortalidade infantil a cada mil nascimentos, que era 116 em 1965, caiu a 63 em 1985 (e melhorou cada vez mais até chegar a 15,3 em 2011).”

No meio desse festival de inverdades, o que deve ser importante é considerar que o sentido apologético de tal leitura do passado é hoje defendido por parte de uma historiografia que se pretende “inovadora”. Não estamos falando aqui de gente sem respaldo acadêmico, mas de pesquisadores profissionais com ampla influência acadêmica que vêm na última década produzindo uma leitura normalizada do passado ditatorial, atribuindo, por exemplo, ao período do chamado “milagre” uma “era de ouro para não poucos” (Mais nestes artigos:clique aqui e aqui). Em suma, existe uma historiografia revisionista que dá chancela acadêmica ao jornal da ditabranda…
Demian Melo é historiador.

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