quarta-feira, 21 de agosto de 2013

“Aldeia Maracanã deve ser pensada e gerida por índios”

Urutau Guajajara defende que o Centro de Cultura Indígena, proposto pelo governo do Estado, seja administrado por índios


Vivian Virissimo,
do Rio de Janeiro (RJ)

Desde que o prefeito Eduardo Paes e o governador Sérgio Cabral publicaram decretos que tombam o prédio do antigo Museu do Índio, os rumos e o futuro da Aldeia Maracanã estão em disputa.
De um lado, está a proposta do governo de criar um “Centro Estadual de Estudos e Difusão da Cultura Indígena”. De outro, está o projeto, defendido por algumas etnias, de fundar as bases de uma Universidade Popular Indígena.
Nesta entrevista ao Brasil de Fato, a liderança Urutau Guajajara defende que o espaço não tenha intervenção do Estado e conta como funcionaria a Universidade Popular Indígena.

Brasil de Fato – Paes e Cabral voltaram atrás e resolveram tombar o Museu do Índio. Agora a proposta é viabilizar um Centro Estadual de Estudos e Difusão da Cultura Indígena. Qual é a sua opinião sobre este Centro?

Urutau Guajajara - Foto: Pablo Vergara

Urutau Guajajara – O Centro não pode ser estadual porque questões indígenas são questões federais. Primeiro, porque o patrimônio está no nome da União. Segundo, porque é uma questão indígena fundiária e de demarcação de um território. De qualquer forma, estamos encaminhando essa discussão em grupos de trabalho que estão debatendo o assunto. Mas é problemático um centro “estadual”.

Você defende que o Centro Indígena não tenha intervenção do Estado. Por que a autonomia dos índios é importante?
Porque essa é a chance da Aldeia Maracanã ser o primeiro patrimônio verdadeiramente indígena, pensado e gerido por índios. Nossa posição é que o Estado, prefeitura ou governo federal, venham apenas como parceiros. Reivindicamos isso porque, nesses 513 anos, nós nunca saímos da tutela do Estado. Queremos que o Estado tutele apenas nossos direitos e não o ser humano. Isto está garantido na Constituição e em várias convenções internacionais. Nós queremos administrar nosso patrimônio. Este é o início de uma reparação de danos históricos.

A Aldeia Maracanã sempre foi referência para índios de diferentes etnias e estados que se hospedavam no prédio. Porém, o governo rejeita a possibilidade de que o prédio continue servindo como moradia. Como vocês avaliam isso?
Provavelmente não será como antes, mas queremos que exista um espaço para moradia, sim. Estamos planejando viabilizar uma Universidade Popular Indígena e, com certeza, teremos alunos residentes de outros estados e vamos precisar garantir residências provisórias para estas pessoas. Não seriam moradias permanentes e esta seria uma forma de contornar a situação. De qualquer forma, já temos uma série de reuniões marcadas para debater este e outros temas.

Vocês também travam negociações com o governo federal?
Nós também negociamos com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Isto acontece porque o município pode tombar e destombar no dia seguinte. Esse tombamento aconteceu por um milagre e achamos tudo muito estranho porque o Eduardo Paes e o Sérgio Cabral nunca foram simpáticos com a gente. Na angústia de preservar a Aldeia Maracanã e evitar que o prédio fosse colocado a baixo, descobrimos que qualquer prédio anterior a 1937 automaticamente tem que ser tombado. E simplesmente o Eduardo Paes sempre rejeitou isso, mesmo existindo lei. Agora ele e Cabral mudaram de ideia. Pelo visto, milagres acontecem.

Que tipo de tombamento vocês defendem?
No Iphan estamos discutindo o tipo de tombamento que queremos: com Universidade Popular Indígena, centro indígena e, principalmente, índios. Um tombamento em que caiba o ser humano desenvolvendo atividades culturais. Na universidade teremos cursos de tupi guarani e legislação indígena, por exemplo. O nosso caso, sem dúvida, é uma situação totalmente nova para o Iphan que só está acostumado a tombar igreja. Infelizmente, o processo no Iphan está sendo muito lento.


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