terça-feira, 25 de setembro de 2012

Venezuela: perspectivas e dilemas da revolução na América Latina



“Não há possibilidade de avançar se não enfrentarmos a dominação cultural burguesa”

Entrevista de Amilcar Figueroa sobre os cenários atuais
ALBA TV

Amílcar Figueroa é venezuelano, historiador, politólogo e integrante do Movimento Continental Bolivariano. Até 2011 presidiu o Parlamento Latino-americano (PARLATINO). Conta com uma larga trajetória política vinculada às lutas revolucionárias de Nossa América e participou das compilações “Reforma ou Revolução na América Latina?” (2009) e “El Salvador – Sua história de Lutas” (2009), entre outros.

Em diálogo com a AlbaTV, compartilhou suas impressões acerca do contexto eleitoral do 7 de outubro, os possíveis cenários e estratégias opositoras frente ao triunfo de Hugo Chávez. Além disso, referiu-se aos desafios da revolução bolivariana para a etapa 2013-2019 e seu impacto no contexto latino-americano.


Qual é o cenário que espera para o 7 de outubro e os primeiros dias pós-eleições? Qual será a estratégia da direita neste ínterim?

O que sabemos é que eles pensam e estão trabalhando com um planejamento de alegação de fraude eleitoral. É claro que esta estratégia - lançada a partir da Europa e dos Estados Unidos, com as possibilidades midiáticas que têm o imperialismo e a direita internacional - pode ter algum desdobramento. Dependerá justamente da margem com a qual se ganhe. Se a vantagem for esmagadora vai ficar um pouco mais difícil para que eles instalem este plano. O certo é que a partir disso, setores radicalizados tratariam de aprofundar a desestabilização por diversos meios. Não poderia aqui dizer quais. Em países onde recentemente o imperialismo operou, o ponto comum é a existência de um pequeno grupo interno articulado fundamentalmente na aliança internacional de forças do capital. Por outro lado, há uma parte da oposição venezuelana que tem o espírito de arriscar resultados nas eleições e que está pensando não em processos desestabilizadores, mas na obtenção de algumas conquistas no quadro das eleições regionais de prefeituras e governos, em dezembro.

Estas possibilidades estão aí e não devemos descuidar de nenhuma das duas. Tudo dependerá em boa medida do resultado do 7 de outubro e da margem com a qual ganharemos.


Acerca do médio prazo, com Chávez eleito e o Programa da Pátria em marcha, quais serão os desafios para a revolução bolivariana?

Eu acho que nós devemos começar com algo que reivindica o próprio Comandante Chávez: retificação. É necessário aprofundar o processo apoiando-se nas forças que estão historicamente mais interessadas ​​no desenvolvimento de uma Venezuela socialista. Isso passa por entender com bastante nitidez o quadro de classes da atual realidade venezuelana, qual é a composição morfológica das classes no país hoje e quais dessas classes estão mais interessadas ​​no aprofundamento de uma mudança histórica. Com esta entrada, desenvolver toda a nossa atividade política fundamental naquele espaço. Concentrar-se ali. Tecer o tecido social da revolução a partir de baixo, fortalecer os organismos e o que é dado chamar de poder popular. Creio ser o estratégico. Não há chance de avançar se não dermos um salto na conquista da hegemonia social e, ao mesmo tempo, sem batalhar para reverter a atual dominação cultural. Ainda hoje não nos desprendemos da hegemonia cultural da burguesia. Os valores da sociedade burguesa ainda estão vivos e ativos na sociedade venezuelana. Em todas as instâncias. Então esta é a batalha estratégica frente a qual o movimento revolucionário tem de apontar as suas baterias. Sem uma visão estratégica, teremos muitos outros problemas.


Em palavras de Chávez, um dos objetivos principais desta  etapa consiste em “cruzar o limiar”, consolidando o caminho ao socialismo de maneira tal que as mudanças se tornem transformações irreversíveis. Que análises faz deste objetivo?

Avançar supõe fazer um debate muito forte sobre como entender a transição, como entender o socialismo, o que é o socialismo. Há que trazer ao concreto toda a parte teórica do socialismo e vê-lo na condições da América Latina; nas condições do século XXI. É um grande objetivo para os revolucionários e revolucionárias da Venezuela, onde houve um avanço extraordinário. Desde cedo isso permitiu uma busca criadora em função de adaptar a teoria socialista às condições do século XXI. Mas obviamente temos que batalhar tremendamente na construção teórica. Não há possibilidades de avançar exitosamente se não se faz uma construção teórica acerca da revolução na Venezuela e América Latina. Um esforço intelectual por validar as conquistas daquele campo que poderíamos denominar mundo do trabalho. Vivemos em um momento histórico onde o sistema do capital atravessa sua máxima expansão e onde, por sua vez, experimenta sua maior decadência. Vai se evidenciando que o capitalismo não é opção e que há de se buscá-la fora. Essa opção é o socialismo.


Na atualidade e focando no cenário latino-americano, em que estado se encontra a construção da Pátria Grande? É factível pensar em um projeto socialista continental? Ou estamos em um momento de refluxo das tendências anticapitalistas/anti-imperialistas?

Em 2005 a ALCA sofreu uma tremenda derrota, todavia, depois disso, alguns países da América Latina firmaram Tratados de Livre Comércio com os Estados Unidos. Também tratados de relação estratégica com a Europa. Estes acordos representam a tentativa do capital de recompor sua hegemonia na América Latina. Também avançaram em muitos sentidos, não somente no econômico. Por exemplo, tratam de construir uma espécie de Escola das Américas apoiando-se em alguns países do chamado Eixo Pacífico.
Na contramão, avança-se nas tendências de unidade guiadas pelo espírito bolivariano, como pode-se ver na ALBA. A aliança com os países do MERCOSUL é um avanço neste sentido. Há que aplicá-la em sua justa medida porque supõe grandes objetivos. Para a revolução bolivariana faz-se imprescindível dar um salto na expansão de suas forças produtivas internas, desenvolver uma economia produtiva de corte socialista. Este processo deve apoiar-se nas classes com maior vocação de construção do socialismo mas, também, em um salto no desenvolvimento científico-técnico. Não é possível a construção do socialismo em um só país, e isso está claramente demonstrado pela história e no caso da América Latina há de se combinar este belo processo de unidade com a luta pelo Socialismo.

Algo imprescindível é a unidade dos povos. Até agora se avançou muito na unidade entre os Estados, na boa relação dos chefes de Estado. Mas há de se fortalecer a unidade dos povos e que esta unidade conduza por sua vez a um salto social de natureza revolucionária.



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