sábado, 1 de outubro de 2011

Rio das Ostras: mais um assassinato político na sua história?


Coincidentemente, após publicar o artigo abaixo no site do PSOL Serramar, o jornalista Benoni Alencar foi encontrado morto, em sua casa no Palmital, no último dia 27 de setembro. De acordo com o laudo do IML de Macaé, o corpo apresentava sinais de estrangulamento. A polícia investiga a possibilidade de latrocínio, visto que o dinheiro e o computador do jornalista desapareceram. Veja o noticiário sobre o caso: Jornalista Benoni Alencar é enterrado em Palmital; polícia suspeita de latrocínio


Leia a seguir o artigo publicado por Benoni Alencar no último dia 24 de setembro de 2011 no site do PSOL Serramar


Verde e laranja, cores de um mesmo borrão


Por BENONI ALENCAR

Um grupo de participantes do “Encontro Fé e Política”, realizado em Riodas Ostras, em 20 de agosto, no salão paroquial, acompanhou o palestrante Chico Alencar, deputado federal pelo PSOL-RJ, para uma conversa sobre o partido, que se realizaria no pólo riostrense da UFF (Puro), numa iniciativa do Núcleo Serramar, que organiza o próprio PSOL no município. Ali, nos comentários sobre a situação política em Rio das Ostras, ouvi pela primeira vez a expressão “verdes e laranjas”, para designar a dicotomia eleitoral existente na cidade. Os verdes, personificados pelo ex-prefeito e, hoje, deputado Alcebíades Sabino [PSC]; os laranjas, pelo atual prefeito Carlos Augusto Baltazar {PMDB]. Um participante resumiu o sentimento geral com esta frase: “As duas cores, só na aparência, representam políticas distintas. Ambas são faces de uma mesma moeda – a moeda dos grupos econômicos que estão por trás deles e que financiam suas campanhas eleitorais”.


Calado encontrava-me, calado fiquei — queria mais ouvir do que falar. Mas, em casa, arrependi-me dessa posição, e resolvi escrever sobre o que sei dessa curiosa situação de Rio das Ostras. E, de cara, dou razão aos participantes do encontro com Chico Alencar — Sabino e Carlos Augusto são farinha do mesmo saco. Pois se apoiam nos mesmos grupos econômicos, e governam com os mesmos métodos e o mesmo modelo. Mas vamos aos fatos. Carlos Augusto só pôde ser alçado à categoria de grande cacique municipal porque teve o apoio de Sabino para ser seu sucessor, em 2004. O chefe do PMDB, na eleição anterior, em que Sabino obteve o segundo mandato, pretendeu, sim, disputar a Prefeitura. Mas, como me disse numa conversa em que eu me achava no papel de repórter da “Folha dos Municípios”, não iria se aventurar por causa do “custo muito alto da campanha”. Assim,só viria a se candidatar quatro anos depois, quando selou a paz com Sabino, unificando as fontes financiadoras da política de Rio das Ostras. Nas eleição seguinte, dividiram-se – dividindo também as fontes financiadoras. Carlos Augusto levou a melhor.



O próprio Sabino – e é isso que quero contar – só chegaria à condição de chefão da política riostrense por causa de uma briga entre o primeiro prefeiro municipal, Cláudio Ribeiro, e os financiadores da política local. O hoje deputado contou-me a longa história, na presença de um amigo dele de infância, o médico Cláudio Alencar do Rego Barros. Vou procurar resumi-la. Cláudio Ribeiro, comerciante do ramo de marmoraria e vereador à Câmara de Casimiro de Abreu, disputou a eleição do município recém-emancipado — tendo como adversários o também vereador Gélson Apicelo, segundo mais votado, e o então bancário magricela Alcebíades Sabino, terceiro.



Na metade do mandado, quando se achava com a popularidade mais baixa que rabo de cobra, Cláudio Ribeiro chamou Sabino ao seu gabinete de prefeito, e lhe disse que iria iniciar uma nova etapa do mandado, necessitando do seu apoio. Revela, então, que rompera com os que haviam financiado sua eleição, dirigindo-lhes estas palavras: “Vocês já roubaram o suficiente; agora é minha hora de atender meus compromissos com os eleitores, governando para a cidade”. Ou seja, Cláudio colocava ponto final na roubalheira que permitira até ali, e agora queria recuperar o respeito do povo — que o tratava carinhosamente de “Coronel”, retribuição a um tratamento que Cláudio, homem comunicativo e cheio de energia, contando pouco mais de 40 anos, dispensava a todos que se acercavam dele. Olhou duramente os olhos de Sabino, e segredou-lhe, em voz reveladora de medo. “Esses homens são capazes de tudo, até de me matar. Por isso escolhi você para me apoiar, com seu grupo”.



Assassinado menos de dois meses depois, Cláúdio Ribeiro expôs o seguinte plano. Desembaraçado dos sugadores do magro Orçamento municipal (não havia ainda o pote de ouro dos royalties do petróleo), recuperaria a popularidade, e apoiaria Sabino na sucessão (também não havia ainda a reeleição). Sabino, em contrapartida, deveria dar-lhe suporte na guerra “política” que eclodiria na cidade a partir daquele rompimento . Cético quando à possibilidade de Cláudio dar a volta por cima na sua impopularidade, Sabino prometeu dar resposta depois e pôs uma pedra sobre o assunto. Agoniado com a enrascada em que estava metido, Cláudio Ribeiro decidiu pôr o carro adiante dos bois, fazendo publicar nos jornais municipais, que controlova por meio das subvenções que dispensava à imprensa, a seguinte manchete: “Sabino é o candidato de Cláudio à sua sucessão”.



Sabino tremeu quando viu impressa aquela ameaça, no alto da página. Lastimou com seus botões a leviandade de Cláúdio, que não esperara sua resposta – que seria negativa. Coronel, àquela altura da sua infeliz administração, não tinha prestígio para eleger sequer um vereadorzinho pescado em sobra de legenda. Imagine-se fazer o sucessor. Enquanto o magricela bancário digeria fel com que Cláudio o “mimava”, remoendo formas de minimizar os estragos que aquilo causava aos seus planos eleitorais, explode a bomba. Dois pistoleiros de aluguel, vindos do Rio, contratados pelos que Cláudio frustrara com sua decisão de acabar com a roubalheira, mataram-no com vários tiros nas costas, no seu sítio em Vila Verde, em pleno meio dia .



Eu ainda morava em Niterói, e havia passado em Rio das Ostras um dos adoráveis fins-de semana que costumava desfrutar aqui, no verão, quando me deparei com a nota do assassinato de Cláudio Ribeiro na minha mesa de redator do “Jornal do Commercio”, do Rio, cabendo-me editar a notícia. Fi-lo com angústia. Em aqui voltando, semanas depois, soube do resto da história. O povo compreendeu a tragédia de seu querido Coronel, perdoou-o pelos anos de mau governo, e fez do enterro dele a maior manifestação popular da história de Rio das Ostras — até não superada. A bem dizer ninguém ficou em casa – todos foram para a rua em lágrimas, levar o esquife do prefeito ao cemitério. Sabino seria confirmado, pela viúva de Cláudio, como o escolhido dele para a sucessão, e logrou eleger-se, derrotando o então favorito Gélson Apicelo, do PDT. Detalhe: a vice de Coronel, que completaria seu mandato, era também do PDT.



A história dessa tragédia, que relembro ainda com emoção, mostra como a política de Rio das Ostras é governada pelos financiadores de campanha, que recuperam o capital investido, multiplicado várias vezes, com os contratos que celebram com a Prefeitura durante o mandato do pupilo eleito. Contratos — ou votos para deputado na eleição seguinte, como é o caso do deputado federal Alexandre Santos, do PSDB, apoiado por Sabino desde o primeiro mandato; apoio mantido com Carlos Augusto.



E este é o motivo, a meu ver, pelo qual nunca a política em Rio das Ostras se renova. Numa eleição sobem os verdes; na outra, os laranjas. Por detrás, sem visibilidade clara para os eleitores, os que nunca perdem eleição — os financiadores doublés de contratantes da Prefeitura, ou de deputados “benfeitores do município”, na expressão com que os prefeitos (laranja ou verdes) os apresentam à população. O campeão, até agora, é Alexandre Santos.

Benoni é integrante do Núcleo Serramar do PSOL, é jornalista e técnico judiciário.


FONTE: PSOL Serramar

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